sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

O Futuro da Política


Reiteradamente preconizada, mas lentamente materializada, a reforma política é tema que raramente deixou de figurar na agenda política do país. Não me refiro só à agenda atual, mas também às dos séculos 20 e 19, em razão do divórcio entre poder e sociedade - "principal fonte de instabilidade política que se manifesta entre nós quase permanentemente, e não apenas nos momentos de transição do poder", conforme aponta o historiador José Honório Rodrigues na obra Conciliação e reforma no Brasil. A diferença na circunstância de que a expressão reforma política, hoje tão cediça, no século 19, com maior propriedade, se designava reforma eleitoral.
O que assistimos hoje, em que a reforma política, restrita a mudanças eleitorais, parece ser antídoto para todos os males, já estava diagnosticado há mais de 40 anos pelo autor de Conciliação e reformas no Brasil. Lembremo-nos de que a agenda política que precedeu o movimento militar de 1964 se cingia às "Reformas de base" - exatamente aquelas com as quais nos defrontamos - tidas como necessárias, indispensáveis e inadiáveis para que o Brasil possa consolidar a democracia e crescer a taxas mais altas.
Embora entenda seja necessária a mudança do sistema eleitoral brasileiro, para ensejar o fortalecimento dos partidos políticos, venho insistindo, antes mesmo da realização do plebiscito de 21 de abril de 1993, no qual o povo se pronunciou pela manutenção do regime republicano e do sistema presidencialista, que a reforma política exige um espectro bem mais amplo de medidas. A meu juízo, a pauta das reformas deve abranger grande parte do universo dos diferentes componentes do nosso sistema político. Daí sempre ter dado preferência ao termo reforma institucional, com o propósito de contemplar não só, como até agora, a opção entre os sistemas majoritário, proporcional ou misto.
Entendo que questões referentes à organização federativa, ao relacionamento entre os poderes do Estado, e à reforma legislativa, devem integrar a agenda política, com a mesma intensidade com que se defendem mudanças no sistema eleitoral. A reforma legislativa, por exemplo, é pressuposto da reforma do Congresso Nacional e da modernização e simplificação da legislação brasileira. Trata-se de objetivo para se conseguir a consolidação legislativa prevista no artigo 59 da Constituição de 1988 e já regulamentada pelas Leis Complementares de nºs 95, de 26 de fevereiro de 1998, e 107, de 26 de abril de 2001, mas até hoje sequer iniciada.
Hoje, é vezo generalizado referirmo-nos à reforma política, tomando esse termo como sinônimo de reforma eleitoral e das questões adjetivas dela decorrentes. Se observarmos as hipóteses de trabalho sobre as quais o Congresso tomará suas decisões, caso o faça na atual Legislatura, como seria desejável, é possível concluir que ela se circunscreverá a alguns poucos temas que mais despertam o interesse da opinião pública. Nas propostas aprovadas pelo Senado Federal e em tramitação na Câmara dos Deputados - por sinal há tempos em condições de serem submetidas à deliberação do Plenário - os temas relevantes cingem-se a três mudanças: 1) manutenção do sistema proporcional para eleição dos Deputados; matéria constitucional (art. 45), adotando-se a modalidade do voto em listas fechadas e bloqueadas; 2) fidelidade partidária e 3) adoção do financiamento público de campanhas.
O financiamento público não é conseqüência do sistema de listas fechadas e bloqueadas. Ao contrário, o voto em lista é requisito para viabilizar o financiamento público impraticável com o modelo em vigor de listas abertas. Como repartir R$ 880 milhões de recursos públicos nas eleições municipais, entre 340 mil candidatos a vereador e mais de 15 mil a prefeito, número do último pleito de 2004? A proposta do sistema de listas visa, exatamente, a tornar possível a distribuição do financiamento. Não entre os candidatos, o que seria inviável, mas entre os partidos, aos quais caberia a condução das campanhas eleitorais.
Resta considerar, por fim, que as alterações projetadas podem contribuir para aprimorar este ou aquele aspecto das chamadas reformas institucionais. Mas, seguramente, estarão ainda longe de solucionar o contencioso que constitui uma ampla, necessária e recomendável reforma. Esse, sim, o nosso maior desafio - o de vertebrar duradouras instituições.
As reformas são impostergáveis para que de uma democracia procedimental passemos para uma democracia decisional, capaz de assegurar regras claras indispensáveis ao jogo político compatível com a estabilidade institucional e a segurança jurídica que a nação reclama.


Autor: Marco Maciel
Fonte: Democratas.org.br

Ação penal não pode se basear em denúncia anônima

Procedimento criminal não pode ser instaurado a partir de denúncia anônima. O entendimento é da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça que concedeu Habeas Corpus para arquivar ação que tramitava no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro contra um promotor de Justiça.

E-mail anônimo enviado à Ouvidoria do Ministério Público do Rio de Janeiro informava que o promotor havia cometido crime de injúria contra um procurador de Justiça do Rio de Janeiro durante os debates no plenário do II Tribunal do Júri, em fevereiro do ano passado.

Para o ministro Nilson Naves, o relator do pedido de Habeas Corpus no STJ, procedimento criminal baseado em denúncia anônima é nulo e sofre de ausência de justa causa. Em dezembro passado, o ministro havia concedido liminar suspendendo a tramitação da ação, que já estava em fase de audiência de transação. O relator foi seguido por unanimidade.

O ministro, no entanto, ressalvou a validade das denúncias recebidas por serviços de disque-denúncia, que provocam o Poder Público a apurar a possível ocorrência de ato criminoso.

O ministro entendeu que nestes casos há conflito de valores entre a garantia da liberdade e a garantia da segurança. No caso concreto, optou pela garantia da liberdade. Para definir a questão, considerou preceitos constitucionais como a presunção da inocência, a dignidade da pessoa humana e o princípio da ampla defesa.

De acordo com o ministro, é preciso reconhecer que, se, por um lado, "não se pode negar o interesse da vítima e da sociedade na repressão dos crimes, por outro, a Constituição veda o anonimato, coibindo abusos na livre expressão do pensamento".
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 28 de fevereiro de 2008

Presa quadrilha suspeita de roubo a supermercado em Patos de Minas

Uma operação conjunta das policias Civil e Militar de Patos de Minas resultou nesta quinta-feira na prisão de uma quadrilha suspeita de ter tentado roubar um supermecado da cidade. O crime foi em 18 de novembro do ano passado.

Três homens encapuzados (dois armados) foram até a loja, renderam e amordaçaram quatro funcionários. Durante a ação, os criminosos estavam com as chaves da porta e sabiam a senha que desativa o alarme.

A PM chegou a ser acionada, mas não prendeu os suspeitos, pois um dos integrantes do grupo, um cabo da Polícia, carregava um rádio de comunicação. O aparelho, sintonizado na frequência da polícia, facilitou a fuga.

Segundo a assessoria de imprensa da Polícia Civil, a quadrilha já teria assaltado uma outra empresa em Patos de Minas, que fica no Noroeste do estado. O grupo era investigado desde janeiro.

Junto com o policial, estão detidos Gilson Damico da Silva, Daniela Cristina Ferreira de Sousa, funcionários da firma que fazia a segurança do supermercado, Guilherme Silva Araújo e Lúcio Oliveira da Silva.

Com informações da Polícia Civil de Minas Gerais

Fonte: Portal UAI - Rafael Passos

EXCESSO. PRAZO. PRISÃO CAUTELAR. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO.

A Turma, ao prosseguir o julgamento, entendeu não se aplicar a Súm. n. 21-STJ ao caso em que o recurso em sentido estrito interposto em favor do ora paciente, pronunciado em dezembro de 2005 e preso preventivamente há três anos, ainda aguarda apreciação. Mostra-se evidente o excesso de prazo, quanto mais se a defesa sequer deu causa ao atraso. Anote-se que o co-réu já se encontra em liberdade para aguardar o desenrolar da ação penal. HC 77.469-SP, Rel. Min. Nilson Naves, julgado em 19/2/2008.

Fotos da nossa sala





Cabe liberdade provisória no tráfico de drogas?


Em decisão monocrática proferida no dia 11 de janeiro de 2008, a ministra Ellen Gracie, presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), entendeu que a Lei nº 11.464/07, que modificou a lei dos crimes hediondos (Lei nº 8.072/90) para possibilitar a concessão de liberdade provisória aos autores de delitos hediondos e equiparados, não teria aplicação no caso do tráfico de drogas (crime equiparado).
Para ela, tanto a Constituição Federal de 1988 como a Lei nº 11.343/06 (nova lei de drogas) impedem a aplicação do citado benefício (HC 91.556-STF).

Com a devida vênia, equivocou-se completamente a eminente presidente da Corte Suprema brasileira. Impõe-se que o Pleno do STF corrija essa anomalia o mais pronto possível, para fazer preponderar a cientificidade do Direito penal sobre o PPBI (poder punitivo interno bruto), que, nesta matéria, foi iniciado pelo ministro Felix Fischer (STJ – HC 81.241-GO).

Lendo e relendo o artigo 5°, inciso XLIII, da Constituição não se encontra (nem implicitamente) a vedação da liberdade provisória nos crimes hediondos. Isso foi criação (inconstitucional) do legislador ordinário. Este, por força da Lei nº 8.072/1990, em sua redação original, proibiu, para os autores desses crimes (e equiparados), a concessão do referido benefício (liberdade que é concedida ao agente preso em flagrante, quando desnecessária a prisão cautelar).

No caso do tráfico de drogas, equiparado a crime hediondo desde 1990, a proibição da liberdade provisória foi reiterada na nova lei de drogas (Lei nº 11.343/2006), mais precisamente em seu artigo 44. Desde 8 de outubro de 2006 (data em que entrou em vigor esta última lei) essa proibição, portanto, achava-se presente tanto na lei geral (lei dos crimes hediondos) como na lei especial (lei de drogas).

Esse cenário, contudo, foi completamente alterado com o advento da Lei nº 11.464/2007 (vigente desde 29/03/07), que, alterando a redação do artigo 2°, II, da Lei nº 8.072/90, aboliu a vedação da liberdade provisória.

Como se vê, houve uma sucessão, no tempo, de leis processuais materiais, fenômeno regido pelo princípio da posterioridade, isto é, a lei posterior revoga a lei anterior (essa revogação, como sabemos, pode ser expressa ou tácita; no caso, a Lei nº 11.464/2007, que é geral, derrogou expressamente parte do artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, que é especial).

Em outras palavras: desapareceu do citado artigo 44 a proibição da liberdade provisória, porque a lei nova revogou explicitamente a antiga.
O artigo 2º da Lei dos Crimes Hediondos, alterado pela Lei nº 11.464/07, passou a dizer o seguinte:

"Os crimes hediondos, a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: I – anistia, graça e indulto; II – fiança".

Antes do advento da Lei nº 11.464/07 o antigo artigo 2º proibia a fiança e a liberdade provisória. Agora só veda a fiança. Ou seja: cabe liberdade provisória nos crimes hediondos, na prática da tortura, no tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e no terrorismo.

Quisesse o legislador perpetuar a restrição prevista na Lei de Drogas (artigo 44), optando, portanto, por um tratamento diverso e mais rigoroso, o teria feito expressamente. Assim ocorreu, por exemplo, com a nova redação do artigo 112 da LEP (Lei de Execução Penal):

"Artigo 112 - A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão" ( Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1/12/2003).

O Congresso Nacional, como se vê, ressalvou as hipóteses em que o benefício era vedado pela lei especial, impedindo, assim, os efeitos da lei posterior.

Em síntese: o princípio regente é o da posterioridade (lei posterior revoga a anterior), não o da especialidade, que pressupõe a vigência concomitante de duas ou mais leis, aparentemente aplicáveis ao caso concreto. Não se pode confundir o instituto da sucessão de leis (conflito de leis no tempo) com o conflito aparente de leis.

A diferença entre o conflito aparente de leis penais (ou de normas penais) e a sucessão de leis penais (conflito de leis penais no tempo) é a seguinte: o primeiro pressupõe (e exige) duas ou mais leis em vigor (sendo certo que por força do princípio ne bis in idem uma só norma será aplicável); no segundo (conflito de leis penais no tempo) há uma verdadeira sucessão de leis, ou seja, a posterior revoga (ou derroga) a anterior. Uma outra distinção: o conflito aparente de leis penais é regido pelos princípios da especialidade, subsidiariedade e consunção. O que reina na sucessão de leis penais é o da posterioridade.

Por fim, devemos observar que a interpretação dada pela presidente do STF gera indisfarçável injustiça, pois, proibindo o beneplácito da liberdade provisória somente para o tráfico (e não para outros delitos elencados na Lei nº 8072/90, alguns até mais graves, como o latrocínio, por exemplo), são desconsiderados princípios basilares do Direito Penal, como o da razoabilidade, da proporcionalidade e da isonomia (por que proibir liberdade provisória apenas ao traficante, e não ao estuprador?).

Constantemente alertamos o equívoco de se vedar benefícios penais e/ou processuais a determinados crimes em abstrato, ignorando as circunstâncias que rodeiam o caso concreto, técnica que transforma o magistrado num autômato, fazendo preponderar um positivismo cego, em claro detrimento da Justiça.

Autores:
Luiz Flávio Gomes - doutor em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri, mestre em Direito Penal pela USP, secretário-geral do Instituto Panamericano de Política Criminal (IPAN), consultor, parecerista, fundador e presidente da Cursos Luiz Flávio Gomes (LFG) - primeira rede de ensino telepresencial do Brasil e da América Latina, líder mundial em cursos preparatórios telepresenciais
Rogério Cunha Sanches - professor da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, professor de Direito Penal e Processo penal na Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (Rede LFG), promotor de Justiça de São Paulo


Fonte: Jus Navigandi

Prisão Preventiva e Direitos Fundamentais

Por vislumbrar patente situação de constrangimento ilegal, a Turma deferiu habeas corpus impetrado pela Ordem dos Advogados do Brasil - OAB em favor de ex-Procurador-Geral do Estado do Maranhão, preso preventivamente na denominada “Operação Navalha”, em que investigado o suposto envolvimento de organização criminosa constituída com a finalidade de desviar recursos públicos federais e estaduais destinados à execução de obras públicas, mediante fraudes em contratos licitatórios. No caso, o paciente fora acusado de associar-se a tal grupo criminoso e, valendo-se do cargo que ocupava, emitir pareceres favoráveis a determinada construtora. A custódia estava embasada na conveniência da instrução criminal e na garantia da ordem pública e econômica. Considerou-se insubsistente, na espécie, o requisito da conveniência da instrução criminal, por se constatar inexistente indicação de fatos concretos que levantassem suspeitas ou ensejassem possibilidade de interferência da atuação do paciente para retardar, influenciar ou obstar a instrução criminal. Isso porque não demonstrada, de plano, a correlação entre os elementos apontados pela prisão preventiva relativamente ao risco de continuidade na prática de delitos em virtude da iminência de liberação de recursos do governo federal. Ademais, ressaltou-se que o paciente, quando da decretação da custódia, não ocupava mais a função de Procurador-Geral do Estado, o que afastaria o nexo fático-probatório apto a justificar a validade e a legitimidade das razões para o seu encarceramento.
HC 91386/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.2.2008. (HC-91386)


No tocante ao tema da garantia da ordem pública, reiterou-se que esta envolve, em linhas gerais, as seguintes circunstâncias principais: a) necessidade de resguardar a integridade física ou psíquica do paciente ou de terceiros; b) objetivo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e c) necessidade de assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial o Poder Judiciário, no sentido da adoção tempestiva de medidas adequadas, eficazes e fundamentadas quanto à visibilidade e transparência da implementação de políticas públicas de persecução criminal. Desse modo, enfatizou-se que a liberdade de um indivíduo suspeito do cometimento de crime apenas pode sofrer restrições se houver decisão judicial devidamente fundamentada, amparada em fatos concretos e não apenas em hipóteses ou conjecturas, ou na gravidade do delito. Asseverou-se que, no que se refere aos direitos de caráter penal, processual e processual-penal, não haveria exagero na comprovação de que esses direitos cumprem papel indispensável na concretização do moderno Estado Democrático de Direito, em cuja idéia também se imputa ao Poder Judiciário o papel de garante dos direitos fundamentais. Assim, salientando que no sistema constitucional pátrio o âmbito de proteção de direitos e garantias fundamentais recebe contornos de especial relevância, entendeu-se decisivo o fato de a prisão preventiva dos demais investigados ter sido revogada após a inquirição dos envolvidos. Por isso, afirmou-se que não faria sentido a manutenção da segregação do paciente para a mera obtenção de depoimento, aduzindo-se que a prisão é medida excepcional e não pode ser utilizada como meio generalizado de limitação das liberdades dos cidadãos.
HC 91386/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 19.2.2008. (HC-91386)

Prisão Civil de Depositário Judicial Infiel

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se sustentava a ilegitimidade da prisão civil decretada contra o paciente que, na condição de depositário judicial, remanescera inerte depois de intimado a proceder à entrega de bens penhorados. Alegava-se, na espécie, que a possibilidade de prisão civil do depositário infiel está sendo discutida pelo Supremo, cuja votação sinaliza no sentido de que a aludida restrição da liberdade será expurgada do ordenamento jurídico brasileiro, e que, em razão da gravidade do estado de saúde do paciente, cabível a revogação da prisão, ou então, o seu recolhimento domiciliar. Advertiu-se, de início, que a questão não deveria ser tratada sob o enfoque conduzido pelo impetrante, relativamente ao julgamento do RE 466343/SP (v. Informativos 449 e 450), no qual se discute a constitucionalidade da prisão civil de devedor que descumpre contrato garantido por alienação fiduciária. Enfatizou-se que, no presente caso, a custódia decorreria da não entrega de bens deixados com o paciente a título de depósito judicial. Em conseqüência, considerou-se que a decisão do tribunal a quo estaria em consonância com a jurisprudência desta Corte que entende ser constitucional a prisão civil decorrente de depósito judicial, pois enquadrada na ressalva prevista no inciso LXVII do art. 5º, da CF, ante sua natureza não-contratual. No ponto, asseverou que a repressão se dirige, em essência, à fraude praticada pelo depositário que, assumindo obrigação de colaboração com o Poder Judiciário, viola também os princípios da lealdade e da boa-fé que devem nortear a conduta processual das partes. Por fim, aduziu-se a impossibilidade de análise de fatos e provas na via eleita, a fim de se verificar o estado clínico do paciente para se decidir sobre o exame de prisão domiciliar. Vencido o Min. Marco Aurélio que, salientando não ser auto-aplicável o referido dispositivo constitucional, bem como a subscrição, pelo Brasil, do Pacto de São José da Costa Rica, concedia o writ ao fundamento de que a prisão civil estaria limitada ao inadimplemento inescusável de prestação alimentícia. Precedentes citados: HC 84484/SP (DJU de 7.10.2005) e HC 90759/MG (DJU de 22.6.2007).
HC 92541/PR, rel. Min. Menezes Direito, 19.2.2008. (HC-92541)

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Salário Mínimo vai a R$412 a partir de sábado

Com reajuste de 8,52%, novo valor refere-se ao vencimento de março, pago em abril

O novo salário mínimo de R$412,42, começa a valer a partir deste sábado, dia 1º de março, com reajuste de 8,52% sobre o mínimo atual (R$380,00). A data que já estava prevista, foi confirmada pelo Ministério do Planejamento. O relator geral do orçamento, deputado José Pimentel (PT-CE), informou que o Executivo deverá encaminhar ao Congresso Nacional medida provisória reajustando o piso salarial, já que o projeto de lei neste sentido ainda não foi aprovado pelo Senado.

Fonte: Jornal Hoje em Dia

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Modelo de Nota de Culpa

Colegas,

Como nos foi passado teremos que fazer uma Nota de Culpa, por isso segue abaixo um modelo para os que ainda não fizeram.
Para imprimir clique sobre o modelo.

Convenção 158 : novo debate constitucional

A Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi encaminhada novamente ao Congresso Nacional em fevereiro deste ano. Esta convenção, em vários artigos, cria entraves à demissão sem justa causa. Entre eles, o empregador tem de se justificar junto ao sindicato da categoria, apresentando motivos econômicos ou estruturais para a dispensa.

O Congresso Nacional deverá analisar o texto do ato mediante um projeto de decreto legislativo, que é deliberado por maioria simples na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Se aprovado, o Congresso editará o decreto legislativo que aprovará o texto do ato internacional. O Presidente da República deverá, então, promulgar o ato internacional mediante um decreto presidencial.

Vale lembrar que o texto da Convenção nº 158 da OIT havia sido aprovado pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 68, de 16 de setembro de 1992. Então Presidente, Fernando Henrique Cardoso promulgou a convenção mediante o Decreto nº 1.855, de 10 de abril de 1996. Em dezembro do mesmo ano, porém, depois de muitos debates na sociedade sobre o tema, o governo voltou atrás e editou o Decreto nº 2.100, tornando pública a denúncia da convenção.

Sem entrar no mérito quanto aos procedimentos exigidos para a nova ratificação pelo governo brasileiro, a discussão que se impõe é a respeito da viabilidade de aplicação das normas da Convenção nº 158 nas relações de trabalho no Brasil, em especial aquelas referentes à proteção contra as chamadas dispensas arbitrárias.

A Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso I, estabelece que a relação de emprego será protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos. Portanto, está claro que nossa Constituição exige lei complementar para regulamentar as dispensas arbitrárias ou sem justa causa e não veda tais demissões, exigindo, apenas, na hipótese de sua ocorrência, o pagamento de indenização compensatória, dentre outros direitos.

Em outubro do ano passado, foi publicada uma decisão do TST que aponta a ineficácia da Convenção nº 158

Até que se promulgue essa lei complementar, valem os mecanismos para a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa dispostos no artigo 10 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, como a elevação para 40% da multa sobre o total de depósitos na conta vinculada do Fundo de Garantia Sobre Tempo de Serviço (FGTS). O artigo enumera ainda as dispensas que são vedadas, ou seja, a do empregado eleito para os cargos de direção das comissões internas de prevenção de acidentes (CIPAs), e a da empregada gestante.

Logo, dois são os aspectos que tornam de duvidosa eficácia a medida pretendida pelo governo de proteger a relação de emprego contra as dispensas arbitrárias. O primeiro deles diz respeito ao requisito constitucional de edição de lei complementar para essa finalidade, que, certamente, não estará preenchido com a entrada em vigor das normas da Convenção nº 158 da OIT em nosso ordenamento jurídico, já que, se isso ocorrer da forma proposta pelo governo, terá natureza de lei ordinária.

O outro aspecto igualmente relevante se relaciona com a norma constitucional que não veda dispensas arbitrárias. Dessa forma, a aplicação da regra prevista no artigo 4 da convenção - "Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço." - está fadada a ser declarada inconstitucional, seja pelo não preenchimento do requisito formal para a edição de norma que vise a regulamentação dessa garantia, seja pela incompatibilidade da regra com a norma constitucional vigente que trata do tema.

O tema não é novo para os tribunais trabalhistas do país. Em outubro do ano passado, por exemplo, foi publicada na edição do Diário da Justiça do dia 26 uma decisão da 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em um recurso de revista (744.878/2001.0), na qual se apontava a ineficácia da Convenção nº 158 e se lembrava a controvérsia criada há mais de dez anos. Em dado momento, a decisão diz: "A Constituição Federal, de maneira indiscutível (artigos 7º, I, e 10, I, do ADCT), estabelece a via pela qual há de se estabelecer a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, assim como os mecanismos de reparação respectivos: a Lei Complementar. (...) Se a proteção contra o despedimento arbitrário ou sem justa causa é matéria limitada à lei complementar, somente a lei complementar gerará obrigações legítimas. Como rudimentar exigência de soberania, não se pode admitir que norma inscrita em tratado internacional prevaleça sobre a Constituição Federal."

Conclui-se, portanto, que a iniciativa do governo federal é uma medida inoportuna, que servirá apenas para tumultuar o relacionamento das empresas com a classe trabalhadora, caso venha a ser aprovada pelo Congresso Nacional.

Fonte: Valor Econômico

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Prova de Processo Civil

Colegas,

Para o s que não foram à aula ontem (25/02). O professor Joamar marcou a primeira prova de Processo Civil para o dia 10/03.

Penas para aborto podem ficar mais rigorosas

A Câmara analisa o Projeto de Lei 2433/07, do deputado Marcelo Serafim (PSB-AM), que aumenta os períodos de detenção e reclusão dos crimes de "aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento" (artigo 124 do Código Penal) e de "aborto provocado por terceiro" (artigos 125 e 126). A proposta também tipifica ocmo crime o ato de induzir, instigar e auxiliar mulher grávida a fazer aborto, com punição entre 3 e 6 anos de reclusão.

Atualmente, a lei permite o aborto nos casos de violência sexual e risco de vida da mãe. O Código Penal (Decreto-Lei 2.848/40) pune a gestante que pratica o aborto ilegal, ou permite que ele seja feito, com pena de detenção que varia entre 1 a 3 anos. O projeto aumenta a pena de detenção para 2 a 4 anos.

Punição dobrada
Nos casos de aborto feito sem o consentimento da gestante, cuja pena atual é de 3 a 10 anos de reclusão, a proposta dobra a punição para 6 a 20 anos. Se houver consentimento no aborto praticado por outra pessoa, a pena é aumentada para 4 a 15 anos de reclusão. Hoje, esse crime é punido com reclusão de 1 a 4 anos. "Por estranho que pareça, as penas para o aborto previstas no Código Penal são extremamente brandas. E o pior: induzir, instigar e auxiliar a mulher grávida à prática do aborto não é considerado crime", avalia Marcelo Serafim.

Direito do nascituro
O parlamentar argumenta que a personalidade civil da pessoa começa com o nascimento e que o Código Civil (Lei 10.406/02) garante o direito do nascituro (bebê no ventre da mãe) desde a concepção. "Fica evidente a preocupação da legislação em proteger os direitos de uma criança no ventre da mãe. Para os efeitos civis, ela ainda não é pessoa, mas poderá vir a ser e se tornar herdeira legítima de alguém e ser cidadã. Logo, se nascer com vida, seus direitos irão retroagir à data da concepção", explica.

Tramitação
O projeto será analisado pelas comissões de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, antes de seguir para o Plenário.

Fonte: Câmara dos Deputados Federais

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Crise nos EUA: Brasil deve fazer ajustes para se proteger

O equilíbrio da economia brasileira frente à crise enfrentada pelos Estados Unidos (EUA) depende de uma perspectiva realista da equipe econômica do governo Lula de não aumentar a carga tributária e cortar gastos supérfluos da máquina. A avaliação é do deputado Félix Mendonça (Democratas-BA).

"O governo norte-americano vai derrubar os juros para atrair investimentos e o presidente George W. Bush já enviou ao Congresso um pacote para diminuir impostos. Para manter-se firme, o Brasil terá que fugir de aumentos tributários, flexibilizar juros e partir para uma reforma tributária", destacou Mendonça.

Para o deputado, ainda é prematuro avaliar se o Brasil irá enfrentar recessão por causa da economia norte-americana. Os produtos americanos serão mais procurados com a desvalorização do dólar, mas as commodities brasileiras (Álcool, café, soja, milho e carnes) tendem a manter seus mercados, especialmente na Ásia e União Européia – afirmou.

Félix Mendonça disse que, se o governo americano conseguir aprovar o pacote fiscal, os EUA terão recuperação no mercado interno, com aquecimento das vendas, e, consequentemente aumento das importações. "A perspectiva não é ruim se o Brasil aproveitar o fato de que possui mercados em outros continentes. Mas não se pode descansar sem executar mudanças na gestão dos recursos e na aplicação da receitas", alertou.

Fonte: Democratas

Tucanos: políticas de FH permitiram zerar dívida

Parlamentares do PSDB destacaram na última sexta-feira o papel do governo Fernando Henrique na conquista anunciada semana
passada pelo Banco Central: graças à política de responsabilidade fiscal iniciada na gestão tucana, o país zerou sua dívida externa pela primeira vez.

Para os tucanos, não deixa de ser irônico ver os petistas comemorarem o resultado de uma política que antes taxavam de “neoliberal”. “É inacreditável que celebrem isso como se fosse obra do governo petista. E mais: projeto neoliberal coisa nenhuma, mas sim modernização da economia e construção de uma economia de mercado competitiva”, assinalou o presidente do Instituto Teotônio Vilela, deputado Luiz Paulo Vellozo Lucas (ES).

HERANÇA BENDITA – De acordo com a autoridade monetária, os ativos do governo e do setor privado no exterior superaram todo o endividamento brasileiro com outros países. Isso quer dizer que seria possível pagar a dívida de uma vez só, o que diminui a dependência do país em relação ao fluxo internacional de capitais. Vellozo Lucas apontou as reformas iniciadas nos anos 90, principalmente as levadas a cabo por FH, como responsáveis por essa conquista. “Começou lá atrás com a abertura da economia, depois vieram a renegociação da dívida, o Plano Real e a estabilização”, sustentou.

“Vencemos mais uma etapa do ajuste e das reformas da economia brasileira às quais o PT se opôs ferozmente e a isso batizou, de forma
pejorativa, de projeto neoliberal”, criticou o tucano.



Apesar dos avanços, segundo o parlamentar capixaba, o governo Lula paralisou uma agenda de reformas capaz de fazer frente aos principais problemas da economia brasileira. “Os desarranjos na política energética, os gargalos da infra-estrutura e o gasto excessivo de modo geral são marcas da atual gestão. O projeto de reforma tributária com o qual acenam é extremamente conservador e superficial”, observou.

Ministro da Educação no governo FH, o deputado Paulo Renato Souza (SP) destacou, para desgosto dos petistas, que o partido do presidente
Lula contribuiu com o que consideram “política neoliberal” ao manter as bases lançadas durante a administração tucana. “Não deixa de ser irônico: falavam da herança maldita e agora estão colhendo frutos. A melhora no perfil da dívida é resultado dos já 13 anos de política de estabilização. Isso é bom para o país”, analisou.


Fonte: PSDB

Guilherme de Souza Nucci, quarta-feira, no Fórum Online do IBCCRIM

Em 27.02.2008, Guilherme de Souza Nucci - Mestre e Doutor em Processo Penal; Livre-Docente em Direito Penal; Professor Concursado de Direito Penal na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Magistrado em São Paulo, será o entrevistado e falará sobre "Critérios para Fixação da Pena" no Fórum Online do IBCCRIM. Consulte o conteúdo dos fóruns anteriores e a programação dos próximos encontros clicando aqui!

Fonte: Site IBCCRIM

Progressão de condenados por crime hediondo deve seguir legislação vigente à época do delito

Condenados por crimes hediondos cometidos antes de 28 de março de 2007, data da publicação da nova redação da lei que trata desses crimes, podem progredir de regime com o cumprimento de um sexto da pena, e não com o mínimo de dois quintos, conforme a nova regra. A definição é da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em julgamentos ocorridos na Turma, os ministros vêm entendendo que a inovação prejudicial não pode retroagir, devendo ser aplicada somente aos crimes cometidos após a vigência da nova lei.

A nova redação para a lei de crimes hediondos, dada pela Lei n. 11.464/2007, foi inspirada pelo julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou inconstitucional a vedação da progressão de regime para condenados por crimes dessa natureza. Para adequar-se à interpretação do STF, mas prevendo distinção entre crimes comuns e hediondos, a lei de crimes hediondos (de n. 8.072/90) passou a exigir para a progressão nesses casos que o preso tenha cumprido dois quintos da pena se for primário, ou três quintos caso seja reincidente.

Num dos julgamentos mais recentes, o relator ministro Napoleão Nunes Maia Filho ressalvou que considera inaceitável do ponto de vista jurídico que os condenados por crime hediondo possam progredir de regime carcerário nas mesmas condições de tempo (um sexto da pena) exigidas dos condenados por crimes não-hediondos.

No entanto, apesar desse entendimento pessoal, ao julgar o habeas-corpus, o ministro Napoleão considerou ilegal a aplicação retroativa da nova regra, posição do STJ. De acordo com o ministro, quando o fato que gerou a condenação é anterior à nova legislação, deve ser aplicado o previsto no artigo 112 da Lei de Execuções Penais (LEP), ou seja, a exigência de somente um sexto da pena para a progressão, além da análise de outros requisitos objetivos e subjetivos previstos na mesma lei.

No caso em análise, tratava de um habeas-corpus a condenado por latrocínio a mais de 19 anos de reclusão em regime integralmente fechado. Com a decisão do STJ, o juiz da Vara de Execuções Penais da comarca de Presidente Prudente (SP) terá de apreciar o requerimento de progressão de regime do condenado, como disciplinado pelo artigo 112 da LEP. Esse direito lhe havia sido negado tanto pela primeira quanto pela segunda instância da Justiça paulista.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa STJ

TST veta jornada acima de dez horas para motoristas de ônibus

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho excluiu, do acordo homologado em dissídio coletivo dos rodoviários de Bagé (RS), cláusula que permitia a prorrogação da jornada de trabalho acima de dez horas. A SDC deu provimento a recurso do Ministério Público do Trabalho da 4ª Região (RS) seguindo o voto da relatora, juíza convocada Kátia Magalhães Arruda.

O acordo foi homologado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região no dissídio coletivo de 2006 entre o Sindicato dos Trabalhadores Rodoviários de Bagé e o Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários do Município de Bagé. O Ministério Público, porém, questionou, por meio de recurso ordinário, a cláusula 8ª do acordo, segundo a qual as empresas, em razão da natureza do serviço, poderiam prorrogar a jornada além da décima hora, mediante o pagamento de hora extra. “A natureza do serviço prestado não constitui motivo que autorize seja ultrapassada a jornada normal”, sustentou o MPT em suas razões recursais. “Ao contrário, a fadiga do condutor de transporte coletivo público não prejudica apenas a saúde do trabalhador, mas também põe em risco a segurança dos passageiros e de terceiros”.

Em seu voto, a juíza Kátia Magalhães destacou que a Constituição Federal (artigo 7º, incisos XIII e XVI) garante aos trabalhadores a jornada não superior a oito horas diárias e o adicional de 50% sobre as horas extras. A CLT, por sua vez (artigo 59) limita as horas extras a duas. “Assim, é inválida a cláusula coletiva que estabelece, de modo genérico, a possibilidade de prorrogação da jornada além das dez horas em razão da natureza do serviço”, afirmou a relatora. “A limitação decorre do fato de que a jornada acima de dez horas resulta em desgaste excessivo do empregado motorista, comprometendo sua saúde física e psíquica e prejudicando a necessária concentração para um bom desempenho profissional”, concluiu. (Carmem Feijó)

Esta matéria tem caráter informativo, sem cunho oficial.
Permitida a reprodução mediante citação da fonte Assessoria de Comunicação Social Tribunal Superior do Trabalho Tel. (61) 3314-4404 imprensa@tst.gov.br

Empregados de cooperativas de crédito não são equiparados a bancários

Empregados de cooperativas de crédito não podem ser enquadrados na categoria de bancário. Seguindo voto do relator, ministro Alberto Bresciani, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) que negou a uma funcionária da Cooperativa Central de Crédito Rural de Minas Gerais Ltda. – Crediminas verbas relativas a horas extras trabalhadas além de seis horas diárias, como são devidas aos bancários.

A pretensão da empregada foi inicialmente atendida no primeiro grau, mas o TRT/MG reformou a decisão. Insatisfeita, a funcionária recorreu ao TST. O ministro Alberto Bresciani esclareceu que, embora as cooperativas de crédito integrem o sistema financeiro nacional, elas diferem das instituições bancárias, pois “são constituídas por pessoas de determinado grupo, que desempenham atividade econômica em favor dos seus associados, não visam lucro e não realizam todas as operações feitas pelos estabelecimentos bancários”. Ao contrário, “os bancos visam ao lucro, prestam serviços aos seus clientes e terceiros e realizam operações que ultrapassam aquelas efetuadas pelas cooperativas”.

Essas instituições diferem quanto à estrutura e funcionamento, afirmou o relator, acrescentando que o artigo 5º da Lei nº 5.764/71, que define a política nacional de cooperativismo, dispõe, expressamente, que “é vedado às cooperativas o uso da expressão ‘Banco’”. O ministro transcreveu decisões recentes, nesse sentido, da Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do TST.

Na mesma sessão de julgamento, a Terceira Turma decidiu no mesmo sentido os recursos da Cooperativa Central de Crédito do Norte do Brasil – Sicoob Central Norte contra a decisão do Tribunal Regional da 14ª Região (RO) que, ao contrário do TRT/MG, reconheceu a equiparação de um empregado da cooperativa ao trabalhador bancário.

Em ambos os casos a decisão da Turma foi por maioria, ficando vencida a ministra Rosa Maria Weber. (RR-794.905/2001.9 e RR-422-2005-001-14-40.2) (Mário Correia)

Esta matéria tem caráter informativo, sem cunho oficial.
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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Transcrições de decisões do STF

Com a finalidade de proporcionar aos leitores uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Réu preso – Instrução processual – Direito de presença

HC 93503 MC/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PLENITUDE DE DEFESA: UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DA CLÁUSULA DO “DUE PROCESS OF LAW”. CARÁTER GLOBAL E ABRANGENTE DA FUNÇÃO DEFENSIVA: DEFESA TÉCNICA E AUTODEFESA (DIREITO DE AUDIÊNCIA E DIREITO DE PRESENÇA). PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS/ONU (ART. 14, N. 3, “D”) E CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS/OEA (ART. 8º, § 2º, “D” E “F”). DEVER DO ESTADO DE ASSEGURAR, AO RÉU PRESO, O EXERCÍCIO DESSA PRERROGATIVA ESSENCIAL, ESPECIALMENTE A DE COMPARECER À AUDIÊNCIA DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS, AINDA MAIS QUANDO ARROLADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. RAZÕES DE CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA OU GOVERNAMENTAL NÃO PODEM LEGITIMAR O DESRESPEITO NEM COMPROMETER A EFICÁCIA E A OBSERVÂNCIA DESSA FRANQUIA CONSTITUCIONAL. DOUTRINA. PRECEDENTES. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.


DECISÃO: Os fundamentos que dão suporte a esta impetração revestem-se de inquestionável plausibilidade jurídica, pois o caso ora em exame põe em evidência uma controvérsia impregnada da mais alta relevância constitucional, consistente no pretendido reconhecimento de que assiste, ao réu preso, sob pena de nulidade absoluta, o direito de comparecer, mediante requisição do Poder Judiciário, à audiência de instrução processual em que serão inquiridas testemunhas arroladas pelo Ministério Público.

Tenho sustentado, nesta Suprema Corte, com apoio em autorizado magistério doutrinário (FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, “Processo Penal”, vol. 3/136, 10ª ed., 1987, Saraiva; FERNANDO DE ALMEIDA PEDROSO, “Processo Penal – O Direito de Defesa”, p. 240, 1986, Forense; JAQUES DE CAMARGO PENTEADO, “Acusação, Defesa e Julgamento”, p. 261/262, item n. 17, e p. 276, item n. 18.3, 2001, Millennium; ADA PELLEGRINI GRINOVER, “Novas Tendências do Direito Processual”, p. 10, item n. 7, 1990, Forense Universitária; ANTONIO SCARANCE FERNANDES, “Processo Penal Constitucional”, p. 280/281, item n. 26.10, 3ª ed., 2003, RT; ROGÉRIO LAURIA TUCCI, “Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 189, item n. 7.2, 2ª ed., 2004, RT; ANTONIO MAGALHÃES GOMES FILHO, “Direito à Prova no Processo Penal”, p. 154/155, item n. 9, 1997, RT; VICENTE GRECO FILHO, “Tutela Constitucional das Liberdades”, p. 110, item n. 5, 1989, Saraiva; JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, “Direito Processual Penal”, vol. 1/431-432, item n. 3, 1974, Coimbra Editora, v.g.), que o acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar, sob pena de nulidade absoluta, os atos processuais, notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução do processo penal, que se realiza, sempre, sob a égide do contraditório, sendo irrelevantes, para esse efeito, “(...) as alegações do Poder Público concernentes à dificuldade ou inconveniência de proceder à remoção de acusados presos a outros pontos do Estado ou do País”, eis que “(...) alegações de mera conveniência administrativa não têm - e nem podem ter - precedência sobre as inafastáveis exigências de cumprimento e respeito ao que determina a Constituição” (RTJ 142/477-478, Rel. Min. CELSO DE MELLO).

Esse entendimento, hoje prevalecente em ambas as Turmas deste Tribunal (HC 85.200/RJ, Rel. Min. EROS GRAU – HC 86.634/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO), tem por suporte o reconhecimento – fundado na natureza dialógica do processo penal acusatório, impregnado, em sua estrutura formal, de caráter essencialmente democrático (JOSÉ FREDERICO MARQUES, “O Processo Penal na Atualidade”, “in” “Processo Penal e Constituição Federal”, p. 13/20, 1993, APAMAGIS/Ed. Acadêmica) - de que o direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do réu, de outro, esteja ele preso ou não, traduzem prerrogativas jurídicas que derivam da garantia constitucional do “due process of law” e que asseguram, por isso mesmo, ao acusado, o direito de comparecer aos atos processuais a serem realizados perante o juízo processante, ainda que situado este em local diverso daquele em que esteja custodiado o réu.

Vale referir, neste ponto, ante a extrema pertinência de suas observações, o douto magistério de ROGÉRIO SCHIETTI MACHADO CRUZ (“Garantias Processuais nos Recursos Criminais”, p. 132/133, item n. 5.1, 2002, Atlas):

“A possibilidade de que o próprio acusado intervenha, direta e pessoalmente, na realização dos atos processuais, constitui, assim, a autodefesa (...).

Saliente-se que a autodefesa não se resume à partici­pação do acusado no interrogatório judicial, mas há de estender-se a todos os atos de que o imputado participe. (...).

Na verdade, desdobra-se a autodefesa em ‘direito de audiência’ e em ‘direito de presença’, é dizer, tem o acusado o direito de ser ouvido e falar durante os atos processuais (...), bem assim o direito de assistir à realização dos atos processuais, sendo dever do Estado facilitar seu exercício, máxime quando o imputado se encontre preso, impossibilitado de livremente deslocar-se ao fórum.” (grifei)

Incensurável, por isso mesmo, sob tal perspectiva, a decisão desta Suprema Corte, de que foi Relator o eminente Ministro LEITÃO DE ABREU, em acórdão assim ementado (RTJ 79/110):

“Habeas Corpus. Nulidade processual. O direito de estar presente à instrução criminal, conferido ao réu, assenta na cláusula constitucional que garante ao acusado ampla defesa. A violação desse direito importa nulidade absoluta, e não simplesmente relativa, do processo.

.......................................................

Nulidade do processo a partir dessa audiência.

Pedido deferido.” (grifei)

Cumpre destacar, nesse mesmo sentido, inúmeras outras decisões emanadas deste Supremo Tribunal Federal (RTJ 64/332 - RTJ 66/72 - RTJ 70/69 - RTJ 80/37 - RTJ 80/703), cabendo registrar, por relevante, julgamento em que esta Suprema Corte reconheceu essencial a presença do réu preso na audiência de inquirição de testemunhas arroladas pelo órgão da acusação estatal, sob pena de ofensa à garantia constitucional da plenitude de defesa:

“‘Habeas corpus’. Nulidade processual. O direito de estar presente à instrução criminal, conferido ao réu e seu defensor, assenta no princípio do contraditório. Ao lado da defesa técnica, confiada a profissional habilitado, existe a denominada autodefesa, através da presença do acusado aos atos processuais. (...).”
(RTJ 46/653, Rel. Min. DJACI FALCÃO – grifei)

Essa orientação, por sua vez, reflete-se no magistério jurisprudencial de outros Tribunais (RT 522/369 - RT 537/337 - RT 562/346 - RT 568/287 - RT 569/309 - RT 718/415):

“O direito conferido ao réu de estar presente à instrução criminal assenta-se na cláusula constitucional que garante ao acusado ampla defesa. A violação desse direito importa nulidade absoluta, e não apenas relativa, do processo.”
(RT 607/306, Rel. Des. BAPTISTA GARCIA - grifei)

Não constitui demasia assinalar, neste ponto, analisada a função defensiva sob uma perspectiva global, que o direito de presença do réu na audiência de instrução penal, especialmente quando preso, além de traduzir expressão concreta do direito de defesa (mais especificamente da prerrogativa de autodefesa), também encontra suporte legitimador em convenções interna­cionais que proclamam a essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal, mesmo que se trate de réu processado por suposta prática de crimes hediondos ou de delitos a estes equiparados.

A justa preocupação da comunidade internacional com a preservação da integridade das garantias processuais básicas reconhecidas às pessoas meramente acusadas de práticas delituosas tem representado, em tema de proteção aos direitos humanos, um dos tópicos mais sensíveis e delicados da agenda dos organismos internacionais, seja em âmbito regional, como o Pacto de São José da Costa Rica (Artigo 8º, § 2º, “d” e “f”), aplicável ao sistema interamericano, seja em âmbito universal, como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 14, n. 3, “d”), celebrado sob a égide da Organização das Nações Unidas, e que representam instrumentos que reconhecem, a qualquer réu, dentre outras prerrogativas eminentes, o direito de comparecer e de estar presente à instrução processual, independentemente de achar-se sujeito, ou não, à custódia do Estado.

Impende reconhecer, por extremamente relevante, que o entendimento que ora exponho na presente decisão tem, hoje, o beneplácito da jurisprudência que ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal firmaram na matéria em causa:

“‘HABEAS CORPUS’. EXTORSÃO MEDIANTE SEQÜESTRO. PACIENTE PRESA EM SÃO PAULO, RESPONDENDO À AÇÃO PENAL NO RIO DE JANEIRO. CONDENAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA: AUSÊNCIA DA RÉ NOS ATOS PROCESSUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE ENTREVISTAR-SE COM A DEFENSORA NOMEADA EM OUTRA UNIDADE DA FEDERAÇÃO.

1. Paciente condenada por crime de extorsão mediante seqüestro. Ação penal em curso no Rio de Janeiro. Paciente presa em São Paulo. Ausência de contato com o processo em que figurou como ré. Impossibilidade de indicar testemunhas e de entrevistar-se com a Defensora Pública designada no Rio de Janeiro. Cerceamento de defesa.

2. A falta de recursos materiais a inviabilizar as garantias constitucionais dos acusados em processo penal é inadmissível, na medida em que implica disparidade dos meios de manifestação entre a acusação e a defesa, com graves reflexos em um dos bens mais valiosos da vida, a liberdade.

3. A circunstância de que a paciente poderia contatar a Defensora Pública por telefone e cartas, aventada no ato impugnado, não tem a virtude de sanar a nulidade alegada, senão o intuito de contorná-la, resultando franco prejuízo à defesa, sabido que a comunicação entre presos e pessoas alheias ao sistema prisional é restrita ou proibida.

Ordem concedida.”
(HC 85.200/RJ, Rel. Min. EROS GRAU, Primeira Turma – grifei)

“‘HABEAS CORPUS’ - INSTRUÇÃO PROCESSUAL - RÉU PRESO - PRETENDIDO COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA PENAL - PLEITO RECUSADO - REQUISIÇÃO JUDICIAL NEGADA SOB FUNDAMENTO DA PERICULOSIDADE DO ACUSADO - INADMISSIBILIDADE - A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PLENITUDE DE DEFESA: UMA DAS PROJEÇÕES CONCRETIZADORAS DA CLÁUSULA DO ‘DUE PROCESS OF LAW’ - CARÁTER GLOBAL E ABRANGENTE DA FUNÇÃO DEFENSIVA: DEFESA TÉCNICA E AUTODEFESA (DIREITO DE AUDIÊNCIA E DIREITO DE PRESENÇA) - PACTO INTERNACIONAL SOBRE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS/ONU (ARTIGO 14, N. 3, ‘D’) E CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS/OEA (ARTIGO 8º, § 2º, ‘D’ E ‘F’) - DEVER DO ESTADO DE ASSEGURAR, AO RÉU PRESO, O EXERCÍCIO DESSA PRERROGATIVA ESSENCIAL, ESPECIALMENTE A DE COMPARECER À AUDIÊNCIA DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS, AINDA MAIS QUANDO ARROLADAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - RAZÕES DE CONVENIÊNCIA ADMINISTRATIVA OU GOVERNAMENTAL NÃO PODEM LEGITIMAR O DESRESPEITO NEM COMPROMETER A EFICÁCIA E A OBSERVÂNCIA DESSA FRANQUIA CONSTITUCIONAL - NULIDADE PROCESSUAL ABSOLUTA - AFASTAMENTO, EM CARÁTER EXCEPCIONAL, NO CASO CONCRETO, DA INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691/STF – ‘HABEAS CORPUS’ CONCEDIDO DE OFÍCIO.

- O acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar, sob pena de nulidade absoluta, os atos processuais, notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução do processo penal, que se realiza, sempre, sob a égide do contraditório. São irrelevantes, para esse efeito, as alegações do Poder Público concernentes à dificuldade ou inconveniência de proceder à remoção de acusados presos a outros pontos do Estado ou do País, eis que razões de mera conveniência administrativa não têm - nem podem ter - precedência sobre as inafastáveis exigências de cumprimento e respeito ao que determina a Constituição. Doutrina. Jurisprudência.

- O direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do réu, de outro, esteja ele preso ou não, traduzem prerrogativas jurídicas essenciais que derivam da garantia constitucional do ‘due process of law’ e que asseguram, por isso mesmo, ao acusado, o direito de comparecer aos atos processuais a serem realizados perante o juízo processante, ainda que situado este em local diverso daquele em que esteja custodiado o réu. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos/ONU (Artigo 14, n. 3, ‘d’) e Convenção Americana de Direitos Humanos/OEA (Artigo 8º, § 2º, ‘d’ e ‘f’).

- Essa prerrogativa processual reveste-se de caráter fundamental, pois compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal, mesmo que se trate de réu processado por suposta prática de crimes hediondos ou de delitos a estes equiparados. Precedentes.”
(HC 86.634/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma)

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, defiro o pedido de medida cautelar, para suspender, provisoriamente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, os efeitos da decisão proferida pelo E. Superior Tribunal de Justiça nos autos do REsp 906.361/SP, assegurando-se, em conseqüência, ao ora paciente, o direito de permanecer em liberdade, se por al não estiver preso.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao eminente Senhor Ministro-Relator do REsp 906.361/SP (STJ), ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Criminal nº 419.716-3/9-00) e ao MM. Juiz de Direito da 4ª Vara Criminal da comarca de Campinas/SP (Ação Penal nº 175/2002).

Publique-se.

Brasília, 08 de fevereiro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 14.2.2008

Persecução penal - Sigilo - Direito de acesso do advogado, quando constituído (Transcrições)

HC 93767 MC/DF*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO


EMENTA: PERSECUÇÃO PENAL INSTAURADA EM JUÍZO OU FORA DELE. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL OU ACUSAÇÃO CRIMINAL EM JUÍZO. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL). POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

- A pessoa que sofre persecução penal, em juízo ou fora dele, é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorpora­das ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüente­mente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Precedentes. Doutrina.


DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão emanada de eminente Ministra de Tribunal Superior da União, que, em sede de processo idêntico ainda em curso no Superior Tribunal de Justiça (HC 99.402/DF), denegou medida liminar que lhe havia sido requerida em favor do ora paciente.

Presente tal contexto, impende verificar, desde logo, se a situação processual versada nestes autos, justifica, ou não, o afastamento, sempre excepcional, da Súmula 691/STF.

Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal, ainda que em caráter extraordinário, tem admitido o afastamento, “hic et nunc”, da Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte ou, então, veicule situações configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade (HC 85.185/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 86.634-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 86.864-MC/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - HC 87.468/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 89.025-MC-AgR/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - HC 90.112-MC/PR, Rel. Min. CEZAR PELUSO, v.g.).

Parece-me que a situação exposta nesta impetração ajusta-se às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691/STF. Passo, em conseqüência, a examinar a postulação cautelar ora deduzida nesta sede processual.

O caso ora em exame põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que o regime de sigilo – necessariamente excepcional – impõe ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV).

O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado investido de mandato aos procedimentos estatais que tramitam em regime de sigilo – assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal.

Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades emanados do aparelho estatal.

Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal:

“INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO.
- O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto ‘dominus litis’ - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária.

A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações.

O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.”
(RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário.

A pessoa contra quem se instaurou persecução penal - não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República.

Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado.

Cabe referir, nesse sentido, o magistério de FAUZI HASSAN CHOUKE (“Garantias Constitucionais na Investigação Criminal”, p. 74, item n. 4.2, 1995, RT), de ADA PELLEGRINI GRINOVER (“A Polícia Civil e as Garantias Constitucionais de Liberdade”, “in” “A Polícia à Luz do Direito”, p. 17, 1991, RT), de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 383, 1993, Saraiva), de ROBERTO MAURÍCIO GENOFRE (“O Indiciado: de Objeto de Investigações a Sujeito de Direitos”, “in” “Justiça e Democracia”, vol. 1/181, item n. 4, 1996, RT), de PAULO FERNANDO SILVEIRA (“Devido Processo Legal - Due Process of Law”, p. 101, 1996, Del Rey), de ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, p. 60/61, item n. 48, 7ª ed., 1998, Saraiva) e de LUIZ CARLOS ROCHA (“Investigação Policial - Teoria e Prática”, p. 109, item n. 2, 1998, Saraiva), dentre outros.

Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado (e com maior razão, o réu em juízo criminal) ser, ele próprio, sujeito de direitos, que o Advogado por ele regularmente constituído (como sucede no caso) tem direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, não obstante em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente.

É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo - e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o acusado (e, até mesmo, o mero indiciado), por meio de Advogado por ele constituído, tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei).

Vê-se, pois, que assiste, àquele sob persecução penal do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 90.232/AM, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a persecução estatal, como no caso, esteja sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do acusado, desde que por este constituído (como sucede na espécie), poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548):

“Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos, explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade.

A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.

O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei)

Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada:

“INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.

- O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.

- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.”
(HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007)

Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em recentíssima obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem:

“No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7°, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1° do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7° não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5°, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei)

Cumpre referir, ainda, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado:

“ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei)

Cabe assinalar, neste ponto, um outro aspecto relevante do tema ora em análise, considerados os diversos elementos probatórios já produzidos nos autos da persecução penal e, portanto, a estes já formalmente incorporados. Refiro-me ao postulado da comunhão da prova, cuja eficácia projeta-se e incide sobre todos os dados informativos, que, concernentes à “informatio delicti”, compõem o acervo probatório coligido pelas autoridades e agentes estatais.

Esse postulado assume inegável importância no plano das garantias de ordem jurídica reconhecidas ao investigado e ao réu, pois, como se sabe, o princípio da comunhão (ou da aquisição) da prova assegura, ao que sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo -, o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da auto-defesa, quer para desempenho da defesa técnica.

É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado.

Essa compreensão do tema – cabe ressaltar - é revelada por autorizado magistério doutrinário (ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA, “Da Prova no Processo Penal”, p. 31, item n. 3, 3ª ed., 1994, Saraiva; DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “O Princípio da Comunhão da Prova”, “in” Revista Dialética de Direito Processual (RDPP), vol. 31/19-33, 2005; FERNANDO CAPEZ, “Curso de Processo Penal”, p. 259, item n. 17.7, 7ª ed., 2001, Saraiva; MARCELLUS POLASTRI LIMA, “A Prova Penal”, p. 31, item n. 2, 2ª ed., 2003, Lumen Juris, v.g.), valendo referir, por extremamente relevante, a lição expendida por JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“O Juiz e a Prova”, “in” Revista de Processo, nº 35, Ano IX, abril/junho de 1984, p. 178/184):

“E basta pensar no seguinte: se a prova for feita, pouco importa a sua origem. (...). A prova do fato não aumenta nem diminui de valor segundo haja sido trazida por aquele a quem cabia o ônus, ou pelo adversário. A isso se chama o ‘princípio da comunhão da prova’: a prova, depois de feita, é comum, não pertence a quem a faz, pertence ao processo; pouco importa sua fonte, pouco importa sua proveniência. (...).” (grifei)

Cumpre rememorar, ainda, ante a sua inteira pertinência, o magistério de PAULO RANGEL (“Direito Processual Penal”, p. 411/412, item n. 7.5.1, 8ª ed., 2004, Lumen Juris):

“A palavra comunhão vem do latim ‘communione’, que significa ato ou efeito de comungar, participação em comum em crenças, idéias ou interesses. Referindo-se à prova, portanto, quer-se dizer que a mesma, uma vez no processo, pertence a todos os sujeitos processuais (partes e juiz), não obstante ter sido levada apenas por um deles. (...).

O princípio da comunhão da prova é um consectário lógico dos princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico processual, pois as partes, a fim de estabelecer a verdade histórica nos autos do processo, não abrem mão do meio de prova levado para os autos.

(...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.” (grifei)

Nem se diga que a existência de co-indiciados (ou de co-réus) poderia obstar o exercício do direito de acesso à prova penal já formalmente introduzida nos autos da persecução estatal. É que, mesmo que haja co-réus (ou co-indiciados), a concessão da presente medida cautelar, ainda assim, garantirá, ao ora paciente (por intermédio dos Advogados por ele constituídos), acesso a toda e qualquer prova, desde que formalmente incorporada aos autos, especialmente porque a tanto o autoriza o postulado da comunhão da prova.

É por tal razão que se impõe assegurar, ao ora paciente, por intermédio dos patronos que constituiu, o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos da persecução penal em causa, mesmo porque o conhecimento do acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a própria defesa do paciente em questão.

É fundamental, como salientado, para o efeito referido nesta decisão, que os elementos probatórios já tenham sido formalmente produzidos nos autos da persecução penal.

O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que o réu (ou indiciado, quando for o caso) tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada ou processada pelo Estado, não obstante o regime de sigilo excepcionalmente imposto ao procedimento de persecução penal.

O fascínio do mistério e o culto ao segredo não devem estimular, no âmbito de uma sociedade livre, práticas estatais cuja realização, notadamente na esfera penal, culmine em ofensa aos direitos básicos daquele que é submetido, pelos órgãos e agentes do Poder, a atos de persecução criminal, valendo relembrar, por oportuno, a advertência de JOÃO BARBALHO feita em seus comentários à Constituição Federal de 1891 (“Constituição Federal Brasileira – Comentários”, p. 323/324, edição fac-similar, 1992, Senado Federal):

“O pensamento de facilitar amplamente a defesa dos acusados conforma-se bem com o espírito liberal das disposições constitucionais relativas à liberdade individual, que vamos comentando. A lei não quer a perdição daqueles que a justiça processa; quer só que bem se apure a verdade da acusação e, portanto, todos os meios e expedientes de defesa que não impeçam o descobrimento dela devem ser permitidos aos acusados. A lei os deve facultar com largueza, regularizando-os para não tornar tumultuário o processo.

Com a ‘plena defesa’ são incompatíveis, e, portanto, inteiramente inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusado ou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob a coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas, e em geral todo o procedimento que de qualquer maneira embarace a defesa.

Felizmente, nossa legislação ordinária sobre a matéria realiza o propósito da Constituição, cercando das precisas garantias do exercício desse inauferível direito dos acusados – para ela ‘res sacra reus’” (grifei)

Em conclusão, e tal como decidi no MS 24.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO (Informativo/STF nº 331), cumpre enfatizar, por necessário, que os estatutos do poder, numa República fundada em bases democráticas, não podem privilegiar o mistério.

A Assembléia Nacional Constituinte, em momento de feliz inspiração, repudiou o compromisso do Estado com o mistério e com o sigilo, que fora tão fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior (1964-1985), quando no desempenho de sua prática governamental.

Ao dessacralizar o segredo, como proclamou esta Corte Suprema (RTJ 139/712-713, Rel. Min. CELSO DE MELLO), a Assembléia Constituinte restaurou velho dogma republicano e expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade, convertido, em sua expressão concreta, em fator de legitimação das decisões e dos atos governamentais.

É preciso não perder de perspectiva que a Constituição da República não privilegia o sigilo, nem permite que este se transforme em “praxis” governamental, sob pena de grave ofensa ao princípio democrático, pois, consoante adverte NORBERTO BOBBIO, em lição magistral sobre o tema (“O Futuro da Democracia”, 1986, Paz e Terra), não há, nos modelos políticos que consagram a democracia, espaço possível reservado ao mistério.

Tenho por inquestionável, por isso mesmo, que a exigência de publicidade dos atos que se formam no âmbito do aparelho de Estado traduz conseqüência que resulta de um princípio essencial, a que a nova ordem jurídico-constitucional vigente em nosso País não permaneceu indiferente, revestindo-se de excepcio­nalidade, por isso mesmo, a instauração do regime de sigilo nos procedimentos penais, consideradas, para tanto, razões legítimas de interesse público, cuja verificação, no entanto, não tem o condão de suprimir ou de comprometer a eficácia de direitos e garantias fundamentais que assistem a qualquer pessoa sob investigação ou persecução penal do Estado, independentemente da natureza e da gravidade do delito supostamente praticado.

Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o curso do Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4, ora em tramitação perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF, sustando, em conseqüência, a realização do interrogatório judicial do ora paciente, com data já designada para o próximo dia 05/03/2008 (fls. 48), ressalvada a prática de atos processuais de urgência ou, se necessário, a produção antecipada das provas consideradas inadiáveis.

Estendo, ainda, referido provimento cautelar, aos demais litisconsortes penais passivos, que, nessa condição, figuram no mesmo procedimento penal instaurado contra o ora paciente (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4) perante a 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF.

Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão à eminente Senhora Ministra-Relatora do HC 99.402/DF (STJ), ao E. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (HC 2007.00.2.014019-8) e ao MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Criminal da Circunscrição Especial Judiciária de Brasília/DF (Processo-crime nº 2007.01.1.122602-4).

Publique-se.

Brasília, 12 de fevereiro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 18.2.2008


Assessora responsável pelo Informativo
Anna Daniela de A. M. dos Santos
informativo@stf.gov.br

Fonte: Informativo STF 494

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Má-fé


Juiz condena fiel em ação movida contra a Folha

O juiz estadual Alessandro Leite Pereira, de Bataguaçu (MS), condenou Carlos Alberto Lima, fiel da Igreja Universal do Reino de Deus, à pena de litigância de má-fé por entender que, mesmo sem legitimidade, iniciou uma ação contra a Empresa Folha da Manhã S.A., que edita o jornal Folha de S. Paulo, pedindo indenização por danos morais.

“A postura adotada pelo autor demonstra a existência de inquestionável má-fé, pois deturpa o conteúdo da reportagem para, inserindo-se individualmente nela, buscar indevidamente o recebimento de valor indenizatório”, decidiu o juiz.

"O Poder Judiciário está sendo utilizado pelo autor para o fim espúrio de prejudicar os demandados, tendo em vista que diversas demandas, com a mesma causa de pedir e pedido, foram distribuídas pelos variados rincões do país, em localidades de difícil acesso, sendo nítida a intenção do autor, como também dos demais demandantes nas ações mencionadas, de dificultar a defesa dos réus", observou Alessandro Pereira.

De acordo com informações da Folha, Lima e outros fiéis da Universal moveram ações simultâneas alegando terem se sentido ofendidos pela reportagem “Universal chega aos 30 anos com império empresarial”, publicada pela Folha em 15 de dezembro. No texto, a repórter Elvira Lobato relatou que a Universal construiu um conglomerado empresarial. O jornalista informou que uma das empresas da Igreja, a Unimetro, está ligada à Cableinvest, registrada no paraíso fiscal da ilha de Jersey, no canal da Mancha. "O elo aparece nos registros da empresa na Junta Comercial de São Paulo. Uma hipótese é que os dízimos dos fiéis sejam esquentados em paraísos fiscais", informou a repórter.

Para os fiéis, a reportagem “insinuou” que os membros da Universal são inidôneos e que o dízimo pago por eles é produto de crime. Disseram ainda que ouviram gozações de conhecidos.

“Se o autor está sendo vítima de chacotas de terceiras pessoas, é contra estas pessoas que o demandante deve direcionar a demanda”, escreveu o juiz. Segundo ele, Lima não tem legitimidade por não ter sido citado na reportagem. Alessandro Leite Pereira ainda considerou que "sequer há provas nos autos de que o autor seja fiel da Igreja Universal do Reino de Deus e que efetua o pagamento do dízimo."

O juiz aplicou multa e condenou o fiel a pagar custas, despesas e honorários, que arbitrou em R$ 800 (1% do valor da causa). Cabe recurso.

Argumentos

Ao todo, 28 fiéis da Igreja Universal entraram na Justiça com ações individuais contra a Empresa Folha da Manhã. Eles sustentam que a reportagem "insinuou" que os membros da igreja são pessoas inidôneas e que o dízimo pago por eles é produto de crime. As petições são iguais, com parágrafos e citações bíblicas idênticas.

O dano narrado pelas partes é idêntico: "O autor [da ação] passou a ser apontado por seus semelhantes com adjetivos desqualificantes e de baixo calão, além de ser abordado com dizeres do tipo: 'Viu só! Você que é trouxa de dar dinheiro para essa igreja!' 'Esse é o povo da sua igreja! Tudo safado!' 'Como é que você continua nessa igreja? Você não lê jornal, não?' 'É. Crente é tudo tonto, mesmo'."

A maioria das ações foi ajuizada em cidades pequenas, como Santa Luzia (PB), Cajazeiras (PB), Bom Jesus da Lapa (BA), Canavieiras (BA), Bataguassu (MS), Alegre (ES) e Barra de São Francisco (ES).


por Priscyla Costa


Fonte: Conjur

Baile de Aleluia





terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Sugestão de Temas para TCC

No concurso de pessoas, vale a discussão de qual a teoria adotada pelo Código Penal: existem três posicionamentos, isto é, autores defendem que o Brasil, diante da adoção da teoria finalista da ação, abraçou a teoria do domínio do fato; outros sustentam a teoria restritiva; e, ainda, há quem defenda que a legislação vigente manteve a teoria extensiva, até porque as expressões contidas nos §§ 1º e 2º do art. 29, CP, já encontravam-se presentes na antiga parte geral.
1) A tipicidade conglobante de Zaffaroni merece também a atenção dos alunos: para essa teoria, a tipicidade penal seria o resultado da soma da tipicidade legal com a antinormatividade (contrariedade à norma), porque não se pode admitir que na ordem normativa uma norma ordene a que outra proíbe e, portanto, algumas ações consideradas pela doutrina como excludente da ilicitude seriam na verdade excludente da própria tipicidade (e portanto a ação desde logo não seria típica);

A possibilidade de adoção da imputação objetiva em nosso ordenamento jurídico é tema interessantíssimo: segundo essa teoria há necessidade de se adicionar ao tipo objetivo do finalismo (ação + nexo causal + resultado) a criação de um risco juridicamente desaprovado e a realização deste risco (Roxin ainda defende o requisito de a vítima não ter se colocado nesta situação de risco);

A individualização da pena apresenta duas vertentes a serem investigadas: a primeira, ligada à finalidade da pena no direito penal brasileiro; a segunda, à constitucionalidade do disposto no art. 9º da Lei de Crimes Hediondos, em que a pena mínima é igual à máxima e, portanto, não há fixação da pena com base na culpabilidade do autor do fato;

Discute-se sobre o conceito de organização criminosa: é sabido que a Lei nº. 9.034/95 não faz qualquer menção à sua definição. Porém, o Brasil ratificou a chamada Convenção de Palermo (Decreto nº. 5.015/2004), que define em seu artigo 2º: “‘Grupo criminoso organizado’ - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material”. Resta saber, portanto, se poderia uma convenção internacional definir crime ou se, ao contrário, estaria sendo violado o princípio da legalidade, como sustenta Luiz Flávio Gomes;

Importante também a questão do aborto: o que fazer quando o direito penal, que seria a ultima ratio, se mostra insuficiente para enfrentar esta questão? O Dossiê Aborto Inseguro, da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos (www.redesaude.org.br), ressalta que “mesmo no cenário de subinformação que cerca os registros sobre aborto, de um modo geral, a mortalidade oficial é alta. Uma mulher morreu a cada três dias, vítima desse agravo, no ano de 1998”. E com base nos dados brasileiros de 2000, estima “um total de abortos clandestinos que poderia variar de 750 mil a 1 milhão e 400 mil”.

Fonte: Trecho da Materia Monografia de Conclusão de Curso: TCC publicada no Jornal Carta Forense Jan/2008